segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Capitalismo Selvagem

   Sou um crítico atroz do Capitalismo; não que comungue das opiniões socialistas ou comunistas. Mas creio que a via que escolhemos para nosso desenvolvimento foi péssima, de maneira que somos incapazes de escapar-lhe, porquanto estamos irremediavelmente vinculados ao consumo. Não obstante, tenho o direito de abominá-lo,e abomino.  O homem transformou amor de pai, amor de mãe, o sexo e até Deus em produtos geradores de lucro: vide o crescimento do comércio, da indústria pornográfica e das igrejas; que vendem carinho, prazer e perdão. E para qualquer coisa que se vislumbre, pergunte-se: quem está lucrando com isso?
   Parafraseando um poeta contemporâneo, o Capitalismo está 'na Natureza'; por isso mesmo o interpreto como 'selvagem'. Isto porque ele não foi uma teoria inventada, ninguém disse: 'a partir de hoje estará fundado um novo sistema'; ele está enraizado e profundamente associado à nossa moral paleolítica, que insiste em permanecer vívida apesar das inovações tecnológicas. Por todos os lados vemos competição, disputa acirrada; seres humanos mais capazes, mais aptos a este ou aquele serviço - seleção natural. Abomino também a Administração e a Economia; podem ser necessárias, porém a que mundo? São duas ciências, imiscuídas a tantas outras que surgem a cada dia, que raciocinam em números, estatísticas e que calculam quanto de prejuízo houve em uma tragédia qualquer, onde centenas de pessoas morrem. Ou será que não é isso que se ouve falar quando há uma enxurrada, terremoto ou incêndio: 'o ramo de hotelaria, o comércio, etc, etc deixaram de lucrar'?  Serão também honestas as intenções daqueles que eregem a solidariedade em grandes painéis para que todos se sensibilizem com suas vultosas contribuições? Quanto não recebem em troca, quanto de renda indireta? 
   Aí vêm a mídia, a consultora de RH e o economista dizer se beltrano está dentro dos padrões de beleza e inteligência, se ele faz parte de uma nova geração, a qual recebeu grande carga de informações, e se é um profissional de ponta a ser aproveitado pelo mercado de trabalho. E se beltrano não for nada disso, ainda lhe restará a velha fórmula da Felicidade, tão alardeada e tão vendida pelos escritores de auto-ajuda: seja feliz com o que você tem, ainda que feio, mal-ajambrado, pobre e desempregado! São esses os valores do Capitalismo. Mais: são esses os valores que a civilização judaico-cristã ajudou a erguer - 'os humilhados serão exaltados, e os exaltados serão humilhados'. Civilização esta, aliás, que defende acintosamente a Democracia, como regime igualitário e ideal para qualquer sociedade, sendo que este mesmo regime, contraditoriamente, é um dos mais desiguais.
   Sou pessimista, sim, o confesso; não acredito na segunda vinda de Jesus ou na Revolução Comunista. Lamento, com pusilanimidade e indolência, a terrível via que a nossa civilização escolheu. A nós cabe remendar pateticamente a solidão na qual nos vemos imersos gradualmente: tratamos os animais feito seres humanos, perdemos mais tempo em frente ao computador, nos furtamos de encontrar amigos e parentes, queremos ser bem-sucedidos antes dos trinta anos, tememos a velhice, desejamos um corpo esbelto e, sobretudo, fugimos dos laços sociais. Resta-nos que Deus tenha comiseração e nos exalte depois dessa humilhação que consentimos ao ajudarmos a manter-se de pé o edifício condenado do Sistema; pois que somos bons filhos e agradecemos por ter a liberdade... Liberdade de consumo.