domingo, 4 de julho de 2010

Impressões Paisagísticas I

Cemitério de Paquetá ao Pôr-do-Sol


   Quando a tarde já ia alta, a barca singrava a passagem entre os pilares da Ponte que, ao modo de garças, com pernas finas e fortes, enfileirados assim, pareciam poder saltar no menor soar de palmas. O vão extenso, no ângulo certo, assemelhava-se a um espaço de várias agulhas, postas umas diante das outras, permitindo ao fio correr folgado e livremente por entre elas. Mal se sabia as águas turvas, douradas pelo Sol daquela hora e agitadas à força do vento. A luz fulgia em raios que desciam pela margem acidentada do Oeste, realçando os pequenos morros de perto e azulando silhuetas de outros mais distantes; e quase encobertos por nuvens diáfanas, furavam-nas e seus braços resplandeciam sobre os montes. Ao fundo, a Serra, quase oculta, porém majestosa em seu contorno gigantesco. E a embarcação, na lentidão de uma tartaruga marinha, balançava por entre navios ancorados e igualmente indolentes - aqui e acolá, cargueiros e petroleiros com suas carcaças robustas de metal. A ilha enfim, verdejando a meio mar, assomou-se à paisagem  após algum tempo de viagem.
   A ilha, mal lembrando um número oito - de extremidades largas e curta no meio - pode-se percorrer em apenas um dia. Ali, visitantes têm o costume de passear em bicicletas e quadriciclos. O porto estava tumultuado de passageiros que chegavam, outros que aguardavam para embarcar, charreteiros, vendedores ambulantes e transeuntes em geral. O cemitério não fica longe dali - atravessando-se algumas ruas de terra batida, ei-lo deitado sobre uma pequena encosta, de muros baixos e entrada franqueada. As inúmeras sepulturas, dispostas nos declives do terreno, em degraus ascendentes, espalhavam-se entre árvores de copas altas, pintadas de branco na raíz. Uma casinha - possivelmente a do zelador - separava a ala destinada aos pássaros; e a capela rústica, no lado oposto, composta de pequeno altar e bancos de pedra para se pôr o esquife, achava-se aberta. A partir do terceiro lance, um caminho de paralelepípedos serpenteava para levar ainda mais alto no terreno, onde havia mais sepulturas e o mato crescido de limite. Poucos túmulos mantinham-se cuidados - azulejos e pastilhas frescos, flores e velas. A maioria estava coberta de limo; uns tinham a tampa quebrada e outros estavam vazios, tomados de terra e vegetação daninha. Apesar da melancolia das cores - verde e marrom acinzentados, bem foscos - o Sol se punha no horizonte, emprestando ao lugar certa vida. Era como se chamasse as almas perdidas para irem com ele - as lápides reluziam o vermelho esmaecido e solene do crepúsculo. O vento fresco ressoava nas folhas e nos galhos em atrito. No mais, era tudo silêncio.
   Fora dali, descendo até a praia, uma via cimentada conduzia ao farol que adentrava a noite fria, o mar bravio e a escuridão. Ouvia-se o marulhar inquieto nas pedras e nos barquinhos sacudidos. Na ponta, um verde luzia do alto de uma torre branca, indicando a entrada na enseada da ilha. Ao sul divisava-se a capital que, junto à outra cidade ao leste, imitavam as estrelas, vistas em maior quantidade dali. A ilha ficava a oeste e, ao norte, apenas um negrume no horizonte. E mais uma vez o vento a soprar tenazmente, interrompendo o sono da Natureza. Na volta, o mesmo quadro, porém, subtraindo-se o Sol, incontáveis lumes, nos barcos e nas margens, afestoavam a paisagem.

Um comentário:

Laura disse...

UAU!!! Nossa... Q texto... Maravilhoso... Eu me senti lá vendo aquela paisagem... A foto, então... Nossa... Quase sobrenatural!!! Enquanto lia eu estava ouvindo uma sonatas pra violino e cravo de Carl Emanuel Bach... E me veio na mente enquanto descrevia a paisagem do cemitério, um violino solitário tocando uma melodia apaixonada mas ao mesmo tempo melancólica q chegava ao seu ápice, ao climax, na parte em q o por-do-sol tinge a paidagem de vermelho, como a nota mais aguda de um violino e quando escurece vem as notas mais graves e de tom misterioso.... Meu... Eu viagem... Isso significa q tá muito bom mesmo!!!